Pouco é contado sobre os deuses Vanir nas antigas fontes escritas em comparação aos Æsir, isso provavelmente por causa do teor sexual e feminino de seus cultos. Quem compilou quase todo o material da cosmovisão nórdica pré-cristã foram pessoas convertidas ao cristianismo e após o período pagão, e eles podem ter suprimido e censurado os contos e/ou práticas do Vanir.
Mas, vamos ao que interessa, provavelmente vocês conhecem o trio mais famoso dos Vanir: Njord e seus filhos Freyr e Freyja que foram enviados aos Æsir como reféns e se tornaram uns dos seus principais deuses, mas existem outros membros dessa família citados nas fontes antigas:
Yngvi era filho de Odin (Óðinn) e pai de Njord, não confunda com o Yngvi-Freyr que é filho deste último, pois são duas divindades distintas. Yngvi é descrito como rei da Turquia (Tyrkjakonungr), mas ele foi evemerizado o que torna difícil de traçar conjecturas (teoria de que deuses antigos eram mortais divinizados). Desse modo, ele aparentemente foi o primeiro Vanir. Segundo se conta, as famílias suecas reais de Uppsala provem dele e de Freyr (seu neto), por isso eles são chamados de Ynglingar.
Gullveig foi a causa da guerra Æsir-Vanir, ela foi até Asgard (Ásgarðr), mas foi queimada e espetada por lanças três vezes, mas renasceu. Ao que tudo indica, ela foi tratada assim por causa de suas habilidades com a magia (ela é praticante de seiðr, prática comum entre os Vanir) e também por causa do ouro (ela é associada a corrupção). Alguns pesquisadores identificam Gullveig com Freyja por causa de algumas similaridades: ambas gostam de ouro, ambas são praticantes de seiðr, e ambas são ditas ter ensinado seiðr para o Æsir (é o que a estrofe da Völuspá dá a entender sobre Gullveig). É difícil saber ao certo, mas é provável que Gullveig fosse uma mensageira dos Vanir e não a própria Freyja, porém, Snorri mencionou que a irmã de Freyr chegou a andar por terras distantes com nomes diferentes. Depois que renasceu, Gullveig passou a ser chamada de Heiðr.
As 9 filhas de Njord (Njarðar dœtr níu) são citadas como um grupo de deusas que riscavam runas no poema Sólarljóð, mas apenas dois nomes foram registrados: a mais velha delas é Ráðveig ou Böðveig e a mais nova entre elas é Kreppvör.
Njord e sua irmã (Njarðar ok systur hans) é uma deusa mencionada como companheira de Njord entre os Vanir, mas ele a deixou quando foi levado a Asgard como refém. O nome dela não é recordado nas antigas fontes, mas é possível que ela seja Nerthus, a deusa germânica citada por Tácito no 1º século, devido a similaridade dos nomes Njord-Nerthus (indicando um par tal como Freyr e Freyja), a associação deles com a água e com a carruagem. Na Ynglinga Saga é narrado que entre o Vanir era comum casamento e/ou relações sexuais entre parentes.
Kvasir aparece como membro do Vanir na Ynglinga Saga, mas na Edda em Prosa ele foi criado pelas duas tribos divinas: Æsir e Vanir, que cuspiram numa vasilha e ele veio a vida. Ele era o mais sábio dos deuses, dotado de grande intelecto e podia responder qualquer coisa. Ele foi morto por anões, que fabricaram o Hidromel dos Poetas. Ele andou pela Terra ensinando sabedoria para os homens antes de ser assassinado.
Hnoss e Gersemi eram as belíssimas filhas de Óðr e Freyja. Óðr pode ser Óðinn (a etimologia do nome é relatado) ou talvez outro personagem. Óðr deixou Freyja, mas a deusa o procurou pelo mundo.
Fjölnir era filho de Freyr e Gerd (Gerðr) e ele governou a Suécia. Ele tinha poder sobre as estações e colheitas, que é herança do Vanir. Ele foi evemerizado. Pertence a família Ynglingar, que são descendentes de Freyr ou Yngvi Freyr.
Svegðir filho de Fjölnir e neto de Freyr. Ele foi evemerizado. Pertence a família Ynglingar, que são descendentes de Freyr ou Yngvi Freyr.
Vana era esposa de Svegðir e ela é uma deusa que habitava no Vanaheim. Svegðir foi até a terra do Vanir para se casar com ela.
Vanlandi era filho de Svegðir e Vana. Ele foi evemerizado. Pertence a família Ynglingar, que são descendentes de Freyr ou Yngvi Freyr.
Visbur (Vísburr) era filho de Vanlandi e Drifa. Ele foi evemerizado. Pertence a família Ynglingar, que são descendentes de Freyr ou Yngvi Freyr.
Depois, outros continuaram a linhagem real e eram associados aos Ynglingar: Dómaldi (filho de Visbur), Dómarr (filho de Dómaldi), Dyggvi (filho de Dómarr), Dagr (filho de Dyggvi), Agni (filho de Dagr), Alrekr e Eiríkr (filhos de Agni), Yngvi e Álfr (filhos de Alrekr), Hugleikr (filho de Álfr), Jörundr (filho filho de Yngvi), Aun (filho de Jörundr), Egill Tunnudólgi (filho de Aun), Óttarr (filho de Egill), Aðils (filho de Óttarr), Eysteinn (filho de Aðils), Yngvarr (filho de Eysteinn), Önundr (filho de Yngvarr), Ingjaldr (filho de Önundr, e o último dos reis suecos Ynglingar, ele foi conquistado pelo rei da Escânia Ivar Vidfamne, mudando assim a linhagem real).
As dinastias reais germânicas eram relacionadas a Odin, Freyr e Heimdall (Heimdallr), e seus descendentes possuíam algum poder divino, mas eles são mais ou menos semideuses, no caso dos Ynglingar, eles possuíam poder sobre o bom tempo, estações e colheita. Linhagem real divina era algo comum na antiguidade, pois vários reis e governantes eram considerados filhos ou escolhidos dos deuses. As dinastias reais relacionadas a Odin eram guerreiras, conquistadoras e forjadoras de império, enquanto as dinastias reais relacionadas a Freyr eram voltadas para práticas sexuais, algumas ligadas a homossexualidade e divinação (os descendentes de Freyr praticavam cultos que eram considerados efeminados por um guerreiro que era devoto de Odin). A linhagem real de Freyr também era voltada para abundância e prosperidade. Por isso, eu creio, que os copistas cristãos (que registravam os textos) preferiu não registrar a cultura ligada ao Vanir, salvo alguma coisa aqui e ali, que eram necessárias a contextualização de um determinado tema. O culto Vanir era extremamente feminino onde profetisas (Völur no plural e Völva no singular) saiam pelas cidades com cortejo de mulheres e até homens. Muitas eram temidas e veneradas. Os homens que praticavam magia Vanir (seiðr) eram vistos como efeminados, mas eram temidos.
Um adendo: não devemos nunca generalizar as coisas: pois Odin aprendeu seiðr com Freyja, e havia guerreiros dedicados ao Vanir que usavam o símbolo do javali como proteção nas batalhas. Com isso, podemos entender que após a guerra Æsir-Vanir, as duas principais tribos divinas trocaram conhecimentos e habilidades, fortalecendo ainda mais seus poderes e entendimentos.
FONTES:
A Genealogia dos Deuses Nórdicos, Marcio Alessandro Moreira (Vitki Þórsgoði)
Gods and Myths of Northern Europe, Hilda R. E. Davidson
Heimskringla: History of the Kings of Norway, Snorri Sturluson trad. Lee M. Hollander
Saxo Grammaticus Gesta Danorum: The History of the Danes Volume I & Volume II, trad. Peter Fisher
Scandinavian Mythology, Hilda R. E. Davidson
SITES CONSULTADOS:
https://heimskringla.no/wiki/Edda_Snorra_Sturlusonar
https://heimskringla.no/wiki/Eddukv%C3%A6%C3%B0i
http://etext.old.no/Bugge/solar.html
http://www.heimskringla.no/wiki/%C3%8Dslendingab%C3%B3k
http://www.heimskringla.no/wiki/S%C3%B3larlj%C3%B3%C3%B0