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quinta-feira, 20 de março de 2025

Lytir, o deus do vagão

 Lytir (Lýtir no nórdico arcaico) é uma divindade mencionada no Hauks Þáttr Hábrókar do Flateyjarbók, porém quase nada sobre ele é conhecido. A pequena descrição sobre ele sugere uma conexão com o Vanir, porém é apenas especulação. Fotos de Internet.

 Segundo a passagem no texto, o deus foi levado numa carruagem até o rei sueco para ser consultado, tal como numa procissão. A carruagem primeiro foi levada a um local sagrado onde o deus entrou, antes de seguir viagem ao reino. Esta descrição lembra muito a da Nerthus (mencionada em Germania por Tácito) e Freyr (mencionado no Ögmundar Þáttr Dytts).

 A Nerthus era levada num carro puxado por bois até o povo porque costumava intervir nos casos humanos, seu carro ficava numa ilha num bosque consagrado e coberto por um véu. Os sacerdotes pressentiam a presença da deusa antes de transportá-la numa procissão.  

 A estátua de Freyr era levada numa carruagem por uma jovem sacerdotisa para ser consultado na Suécia, sua imagem estava viva (Freyr væri lifandi) e falava com o povo. A passagem menciona roupas colocadas na estátua do deus. A ótica cristã do redator da saga descreve a cena como o demônio animando a estátua de Freyr (obviamente pervertendo o simbolismo pagão). Talvez, esse rito era pra celebrar a fertilidade da Terra simbolizado pela união do deus com a sacerdotisa.

 O nome "Lytir" pode estar associado a palavra nórdica antiga "hlutr" significando "sorte" (de cerimonial de tirar a sorte), "quinhão/porção" ou "adivinhar" e com "lýta" (e litr "colorido") que significa "mancha[do]". A velha palavra nórdica "liðr" significa "membro viril/pênis" e também pode estar relacionada. É mais comum Lytir ser identificado com Freyr por causa do seu possível significado de "sorte" algo que é relacionado com o Vanir. Mas, também já foi sugerido que Lytir poderia ser uma variação de Lodur (Lóðurr), um dos três deuses criadores, o que parece bastante improvável, embora o mesmo viajava pelo mundo com Odin (Óðinn) e Hœnir como um trio. Lodur é identificado com Loki em alguns manuscritos, e como o último não é uma divindade benfazeja isso fala contra esta identificação. Contudo, se o nome significar "pênis", isso corrobora com a identificação à Freyr cuja representação era um largo falo segundo o relato de Adam de Bremen (a imagem de Rällinge parece confirmar tal ideia), e ritos com teor sexual são mencionados também por Saxo no templo do deus na Suécia.

 Outra coisa fala em favor dessa identificação: segundo Saxo, as vitimas sacrificadas para Freyr eram negras (furvis hostiis), enquanto o significado de "manchado" pode indicar que a imagem do deus era pintada ou regada a sangue que quando seco ficava escurecida.

FONTES:

A Latin-English Dictionary, William Smith

A Germania, Maria Cecília Albernaz Lins Silva de Andrade

Adam de Bremen - History of the Archbishops of Hamburg-Bremen, Francis J. Tschan

An Icelandic-English Dictionary, Richard Cleasby & M. A. Gudbrand Vigfusson

Dictionary of Northern Mythology, Rudolf Simek trad. Angela Hall

Gods and Myths of Northern Europe, Hilda R. E. Davidson

Lokrur, Lóðurr and Late Evidence, Haukur Þorgeirsson

Saxo Grammaticus vol I & II - Gesta Danorum/The History of the Danes, Peter Fisher

Scandinavian Mythology, Hilda R. E. Davidson

SITES CONSULTADOS:

https://heimskringla.no/wiki/%C3%96gmundar_%C3%BE%C3%A1ttr_dytts_ok_Gunnars_helmings

terça-feira, 2 de janeiro de 2024

As origens de Gerd

 A giganta Gerd (Gerðr), a esposa do Vanr Freyr, era filha de Gymir e Aurboda (Aurboða), ela era extremamente bela e brilhante. Seus pais são ditos serem gigantes da montanha (Hon var bergrisar ættar). Da união dela com Freyr, nasceu o filho Fjolne (Fjölnir) da dinastia Ynglingar, da casa real Sueca.

Skírnir e Gerd, arte de Harry George Theaker de 1920.

 Gerd vivia na casa de seu pai e inicialmente se recusou a se casar com Freyr, até que foi forçada pelo mensageiro dele, Skírnir, com magia rúnica. Então, depois de nove dias, ela se dirigiu a Barri (Cevada) e casou com o filho de Njord (Njörðr).

 Gerd parece ser uma personificação do solo fértil (depois do degelo do inverno), já que Freyr é o deus que comanda o brilho do sol e a fertilidade indicando o casamento sagrado entre o Céu e Terra. O nome de seu pai, Gymir, também é um dos nomes do gigante marinho Ægir. É difícil saber ao certo se ambos são o mesmo personagem, embora faria sentido: o Solo (Gerd) seria filha do Oceano (Ægir) e da Terra (Jord) tal como descrito na Völuspá onde o solo é erguido das águas pelo trio criador na criação (o mesmo acontecerá depois do Ragnarök). A primeira parte do nome da mãe de Gerd, "Aur-", também é um epiteto de Jord (Jörð) no Alvíssmál.

Þórr Kvað (Thor disse):

9."Segðu mér þat, Alvíss (Diga-me Alvíss),

- öll of rök fira (o destino de todos os seres)

vörumk, dvergr, at vitir (eu creio, anão, que tu conhece) -:

hvé sú Jörð heitir (como a Terra é chamada),

er liggr fyr alda sonum (que se estende abaixo),

heimi hverjum í (em todos os mundos)?"

 

Alvíss kvað (Alvíss disse):

10."Jörð heitir með mönnum (Jord é chamada pelos homens),

en með ásum Fold (e entre os æsir é Fold),

kalla Vega vanir (é chamada de Vega pelos Vanir),

Ígræn jötnar (Ígræn pelos gigantes),

alfar Gróandi (pelos elfos de Gróandi),

kalla Aur uppregin (e chamada de Aur pelos Uppregin)."

 Isso corroboraria com a ideia de que o Solo (Gerd) era filha do Oceano (Ægir) e da Terra (Jord). Devo lembrar que Aurboda também aparece ao lado de Menglöð (que pode ser Freyja embora incerto) no Fjölsvinnsmál na montanha Lyfjaberg. Novamente aqui Aurboda é associada a ideia de terra, montanha.


FONTES:

A Genealogia dos Deuses Nórdicos, Marcio Alessandro Moreira (Vitki Þórsgoði)

Dictionary Of Northern Mythology, Rudolf Simek trad. Angela Hall

Edda, Anthony Faulkes

Gods And Myths Of Northern Europe, Hilda R. E. Davidson

Saxo Grammaticus Gesta Danorum: The History of the Danes Volume I, trad. Peter Fisher

Scandinavian Mythology, Hilda R. E. Davidson

The Poetic Edda, Carolyne Larrington

SITES CONSULTADOS:

https://heimskringla.no/wiki/Edda_Snorra_Sturlusonar

https://heimskringla.no/wiki/Eddukv%C3%A6%C3%B0i

http://heimskringla.no/wiki/Ynglinga_saga

sábado, 22 de julho de 2023

As origens de Freyr e Freyja

 Freyr e Freyja são os poderosos filhos de Njord (Njörðr) e sua esposa irmã não nomeada que pode ser Nerthus como vimos no post anterior. Freyr e Freyja eram muito venerados na Escandinávia, com numerosos topônimos (nome de lugar contendo o nome da divindade).

Arte tirada de internet representando Freyr e Freyja e seus animais sagrados.

 No Lokasenna e na Ynglinga Saga, Freyr e Freyja nasceram no Vanir e depois foram levados pelo Æsir num tratado de paz com troca de reféns. Ou seja, eles já eram nascidos na guerra divina.

 No Skírnismál, Skadi (Skaði) clamou que Freyr é seu filho, algo confirmado por Skirnir (Skírnir) no poema, mas, aqui pode ser no aspecto de consideração já que ela foi esposa de Njord. O Gylfaginning mencionou que os irmãos nasceram depois da separação de Njord e Skadi, o que é algo contraditório.

 No Grímnismál é dito que os deuses (tívar) deram Alfheim (Álfheimr) para Freyr como dádiva do dente no início dos tempos, o que indica que foi na mocidade desta poderosa divindade. Provavelmente isso ocorreu quando o trio Vanir foi aceito entre os Æsir: porque os três receberam grandes honrarias. Njord, Freyr e Freyja se tornaram os sacerdotes de sacrifícios dos deuses Æsir e Freyja ensinou magia Vanir para eles. Freyr e Freyja também eram amantes e já foram pegos juntos na cama segundo Loki (pode ser mentira, mas esse hábito sexual entre irmãos era comum entre os Vanir). No poema rúnico Anglo-saxão é registrado que Ing (Yngvi que é outro nome de Freyr) foi visto partindo em direção ao mar. Ing, Ingui, Yngvi e Ingunar-Freyr são variações das denominações de Freyr.

 Freyja pode ter nascido no mar tal como a Afrodite dos gregos (a qual tem muitas similaridades) e a Lakshmi dos hindus, Njord, seu pai, era regente desse elemento, e Vanaheim (Vanaheimr) é descrito sendo ladeado por um rio segundo a Ynglinga Saga (embora os relatos são evemerizados, eles podem conter algum eco pagão verdadeiro). A outra denominação de Freyja, Mardöll que significa "Brilho do Mar", parece confirmar isso. Com isso, podemos deduzir que os irmãos nasceram entre a união do mar (Njord) e da terra (Nerthus). A procissão de Nerthus ia da terra para o mar onde o escravo era sacrificado. Njord, Freyr e Freyja são todos associados ao mar e a terra tal como Nerthus. O mar e a terra são símbolos de abundância e vida. 


FONTES:

A Genealogia dos Deuses Nórdicos, Marcio Alessandro Moreira (Vitki Þórsgoði)

Dictionary of Norse Myth and Legend, Andy Orchard

Edda, Anthony Faulkes

The Poetic Edda, Carolyne Larrington

SITES CONSULTADOS:

https://heimskringla.no/wiki/Edda_Snorra_Sturlusonar

https://heimskringla.no/wiki/Eddukv%C3%A6%C3%B0i

https://heimskringla.no/wiki/Ynglinga_saga

https://sourcebooks.fordham.edu/basis/tacitus-germanygord.asp

https://web.archive.org/web/19990417051946/http://www.ragweedforge.com/rpaa.html

https://web.archive.org/web/19991008051502/http://www.ragweedforge.com/rpae.html

segunda-feira, 12 de junho de 2023

O nascimento de Heimdall

 Heimdall (Heimdallr) é um dos deuses mais interessantes do panteão nórdico, mas infelizmente pouco se sabe sobre essa grande divindade e algumas coisas são confusas e conflitantes. Segundo Snorri na sua Edda em Prosa, Heimdall é filho de Odin (Óðinn) e de nove mães, todas irmãs. O poema Völuspá hin Skamma ("A Völuspá Menor") conta que o deus foi nascido de forma milagrosa e sobrenatural.

Heimdall soprando a Gjallarhorn numa arte islandesa de um manuscrito de 1765.

 Heimdall nasceu no início dos tempos nas profundezas da Terra (Jarðar þrömr), suas nove mães o geraram e elas eram chamadas de: Gjalp ("Aquela Que Uiva"), Greip ("Aquela Que Aperta"), Eistla ("Aquela Que Brilha?" ou "Tempestuosa?"), Eyrgjafa ("Aquela Que Espalha A Areia?"), Ulfrún ("Loba" ou "Runa do Lobo"), Angeyja ("Ilha De Cheiro Agradável?"), Imðr ("Crepúsculo" ou "Tempestuosa"), Atla ("A Terrível") e Járnsaxa ("Aquela Com A Faca De Ferro"). Heimdall nasceu pelo poder da Terra (Jarðar megni), do mar congelado (svalköldum sæ) e pelo sangue do javali sacrificado (sónardreyra). Os nomes das mães de Heimdall sugerem conexão clara com o mar. No poema Hárbarðsljóð da Edda Poética, Odin disfarçado de Hárbarðr se gabou de se deitar com sete irmãs (systrum sjau) que traçavam cordas na areia e elas escavavam profundos vales na terra (rios?) e tal relato pode ter conexão aqui, já que das nove irmãs, sete estavam vivas. Gjalp e Greip foram mortas por Thor (Þórr).

 Heimdall, então, nasceu da união dos poderes da Terra, do mar congelado e do javali sacrificado. As nove gigantas que são suas mães, podem ser a personificação dos rios que ligam os nove mundos, desse modo, cada uma representaria as águas subterrâneas que correm nas raízes de Yggdrasill e acabam se encontrando. Isso parece ser confirmado numa das possíveis tradução da estrofe 2 do poema Völuspá da Edda Poética: "Eu me lembro dos nove domicílios/mundos, das nove gigantas, na gloriosa Dispensadora [Yggdrasill] abaixo da terra/Níu man ek heima, níu íviðjur, Mjötvið mæran fyr mold neðan." O poder da Terra (Jörð) é prolifico, gerador de vida, energia. A Yggdrasill está situada em três níveis cósmicos, cada nível é dividido em três (3 + 3 + 3 = 9), mas conectada as fontes de água.

 O "mar" aqui pode ser Ægir, o gigante marinho, porque a palavra usada "" é um dos epítetos dele na Edda em Prosa e na Edda Poética. Ægir é pai de nove ondas, mas seus nomes não batem com os nomes da Völuspá hin Skamma, a não ser que sejam outras denominações delas. Porém, para complicar, Gjalp e Greip são filhas do gigante Geirrod (Geirröðr), que foram mortas por Thor. Járnsaxa se uniu a Thor e gerou Magni. Heimdall tem certas similaridades com deus irlandês Manannán mac Lir. Manannán mac Lir possuía um suíno que simbolizava a abundância de alimentos tal como o Sæhrímnir de Odin (que pode ter conexão com Heimdall como veremos logo abaixo); Manannán mac Lir significa "O Filho do Mar" e é relacionado ao mar (seu pai, Lir, é o deus do mar), e Heimdall é filho de gigantas marinhas (que alguns conectam com as filhas de Ægir, mas Odin também tem conexão com o mar); Manannán mac Lir é o guardião do outro mundo (mundo dos mortos) e Heimdall é o guardião dos deuses; Manannán mac Lir tinha um cavalo mágico e Heimdall também.

 O javali que foi sacrificado pode ter sido Sæhrímnir, esse javali é morto todos os dias e renasce todas as tardes pra ser servido aos Einherjar (guerreiros) do Valhall (Valhöll). Sæhrímnir representa o renascimento e a abundância. Contudo, a palavra "sónardreya" ("javali sacrificado") é associada a "sónargöltr" ("javali sacrificado") e ambas são ligadas ao Vanir, especialmente Freyr. No poema Þrymksviða da Edda poética Heimdall é dito ver muito além (o futuro) como outro Vanr (os membros do Vanir podem ver o futuro). O sónargöltr sacrificado em honra de Freyr tinha conexão com oráculos e divinação.

 Com isso, podemos deduzir que Heimdall é a personificação da própria Yggdrasill, já que ele está na entrada do céu em Hmininbjörg ("Montanha Celeste"). Odin, é a personificação do céu e isso corroboraria Heimdall ser seu filho, pois suas nove mães ficam embaixo das águas, Heimdall no meio entre a Terra e o firmamento e Odin no alto do céu.


FONTES:

A Genealogia dos Deuses Nórdicos, Marcio Alessandro Moreira (Vitki Þórsgoði)

An Icelandic-English Dictionary, Richard Cleasby & M. A. Gudbrand Vigfusson

Dictionary of Northern Mythology, Rudolf Simek trad. Angela Hall

Gods and Myths of Northern Europe, Hilda R. E. Davidson

SITES CONSULTADOS:

https://heimskringla.no/wiki/Eddukv%C3%A6%C3%B0i

https://heimskringla.no/wiki/Edda_Snorra_Sturlusonar 

quinta-feira, 23 de março de 2023

Os nomes dos planetas e astros na língua Nórdica

 Pouco se sabe sobre a astronomia germânica, porque como já falei antes, os povos germânicos passavam quase todos os seus conhecimentos oralmente. Mas, existe alguma coisa aqui e ali, que é um verdadeiro quebra-cabeças.

Deuses dos planetas e da semana: Tyr (Marte), Odin (Mercúrio), Thor (Júpiter), Frey (Saturno), Freyja e/ou Frigg (Vênus). Arte tirada da internet.

 Como vimos no post anterior, os povos germânicos transliteraram os nomes dos dias da semana quando adotaram a semana romana de 7 dias. Porém, irei focar nos escandinavos para o post não ficar muito longo. O domingo foi chamado, então, pelos escandinavos de "dia do Sol" ou Sunnudagr (Søndag em dinamarquês e norueguês, Söndag em sueco). A segunda-feira era o "dia da Lua" ou Mánadagr (Mandag em dinamarquês e norueguês, Måndag no sueco). A terça-feira era o "dia de Tyr" ou Týsdagr (Tirsdag no dinamarquês e norueguês, Tisdag no sueco). A quarta-feira era o "dia de Odin" ou Óðinsdagr (Onsdag em dinamarquês, norueguês e sueco). A quinta-feira era o "dia de Thor" ou Þórsdagr (Torsdag em dinamarquês, norueguês e sueco). A sexta-feira era o "dia de Freyja" ou Frjádagr (Fredag em dinamarquês, norueguês e sueco). O sábado era o "dia do banho" ou Laugardagr (Lørdag em dinamarquês e norueguês, Lördag em sueco). Os 7 dias da semana eram um reflexo dos 5 planetas visíveis a olho nu juntamente com o Sol e Lua. É claro que em cada país nórdico o dialeto mudou um pouco, mas o significado é o mesmo. Porém, a semana islandesa originalmente não começava no domingo, e sim sempre na quinta-feira no verão e sempre na sexta-feira e/ou sábado no inverno. Isso porque as estações eram divididas em duas partes de 6 meses: verão e inverno (a data do começo do inverno na sexta-feira e sábado existe contradições).

 Contudo, os 5 planetas, e a Lua tinham outras denominações, mas que eram uma referência aos deuses nórdicos. Isso foi registrado no manuscrito islandês Rím I do século 12 d.C. por sacerdotes cristãos (essa obra era uma compilação da contagem de tempo, calendário, sinais do zodíaco, que eram usados pela igreja pra determinar a data de suas celebrações). Vale lembrar que esses nomes podem ou não ser pré-cristãos, porque na Islândia os nomes dos deuses nórdicos na semana foram substituídos depois da cristianização e o mesmo pode ter ocorrido com o nome dos planetas. Na Clemens Saga que é datado entre o século 12 ou 13 d.C. podemos ler algo curioso: o planeta Vênus é chamado de Friggjar Stjarna ("Estrela de Frigg"). Voltando ao manuscrito Rím I, a Lua era chamada de Tungl ("Lua"), Marte era chamado Þrekstjarna ("Estrela da Coragem"), Mercúrio era Málsstjarna ("Estrela do Discurso"), Júpiter era Meginstjarna ("Estrela do Poder"), Vênus era Blóðstjarna ("Estrela de Sangue"), e Saturno era Gnógleiksstjarna ("Estrela da Abundância"). O Sol permaneceu com sua denominação comum: Sól ("Sol"). As características dos nomes planetários neste manuscrito islandês batem com os deuses Máni (deus da Lua, pois na Edda Em Prosa "Tungl" aparece como epiteto da Lua), Tyr (deus da coragem), Odin (deus da sabedoria e da escrita/palavra), Thor (deus do poder, pois ele é descrito como dotado de força e poder na Edda em Prosa e, por isso, ele vence todas as criaturas vivas, sua residência Þrúðheimr significa "Mundo do Poder"), Freyja (ou Frigg, deusa das mulheres, do fluxo menstrual, ambas deusas eram associadas ao parto na Edda Poética) e Njord (ou Freyr, deus da abundância). 

 Vênus era associada principalmente com Freyja na Escandinávia, mas ocasionalmente com Frigg também. Isso se deve por causa da confusão entre as duas deusas que possuem diversas similaridades. O nome do planeta Saturno: Gnógleiksstjarna ou "Estrela da Abundância" somado ao sábado que era o "dia do banho" e relacionado ao mesmo planeta parece confirmar sua conexão com Njord (ou Freyr). Njord era o deus dos mares e da abundância, e seu filho Freyr era associado ao mar, pois ele era dono do navio Skíðblaðnir e ele é o deus da abundância também.

 Seguindo a lógica da Clemens Saga é possível que os outros planetas eram assim denominados na era pré-cristã: Týs Stjarna ("Estrela de Tyr", Marte), Óðins Stjarna ("Estrela de Odin", Mercúrio), Þórs Stjarna ("Estrela de Thor", Júpiter), e Njarðar Stjarna ("Estrela de Njord", Saturno) ou Freys Stjarna ("Estrela de Freyr", Saturno). Infelizmente, apenas a "Estrela de Frigg" é mencionado nesta saga, embora incerto, provavelmente era desse jeito que os outros corpos celestes deveriam ser chamados no passado. Corroborando assim com os dias da semana escandinavo que contém o nome dos deuses correspondente aos 5 planetas, Sol e Lua. Porém, a Clemens Saga é uma tradução islandesa do latim da vida de São Clemente I (Papa Clemente I que também é conhecido como Clemente Romano). Desse modo, o nome do planeta Friggjar Stjarna (Vênus) pode apenas ser uma tradução do latim para o islandês, mas a evidência do fato dos dias da semana conter nomes de deuses, então, é muito possível que seja verdadeiro. O Templo de Júpiter era traduzido como Þórshof ('Templo de Thor") nos manuscritos islandeses, e na Escandinávia existem locais com essa denominação, corroborando a ideia, lugares onde o deus do trovão era realmente venerado. Nomes transliterados mantém algum fundo de verdade por assim dizer. 


FONTES:

Dictionary of Northern Mythology, Rudolf Simek trad. Angela Hall

Invocando os Deuses Nórdicos: dos tempos primitivos aos tempos modernos, Marcio Alessandro Moreira (Vitki Þórsgoði)

Gods and Myths of Northern Europe, Hilda R. E. Davidson

Myth and Religion of the North: The Religion of Ancient Scandinavia, E. O. G. Turville-Petre  

The Icelandic Calendar, Svante Janson

SITES CONSULTADOS:

https://heimskringla.no/wiki/Eddukv%C3%A6%C3%B0i

https://heimskringla.no/wiki/Edda_Snorra_Sturlusonar 

http://www.septentrionalia.net/etexts/

https://time-meddler.co.uk/the-old-icelandic-calendar/

domingo, 19 de março de 2023

Folclore Islandês - Dias da Semana

 Os povos germânicos adaptaram e adotaram a semana romana de 7 dias ao redor do 4 século d.C., mas traduziram o nomes das divindades estrangeiras pelas nativas. A tradução foi com base nos poderes e/ou símbolos comum a ambos panteões. Os romanos por sua vez adaptaram dos gregos, os gregos dos babilônicos e os babilônicos dos sumérios.

Caçada Selvagem dos deuses (Åsgårdsreien), arte de Peter Nicolai Arbo de 1868.

 A escolha de 7 dias da semana é referente aos 5 planetas visíveis a olho nu (Marte, Mercúrio, Júpiter, Vênus e Saturno) juntamente com o Sol e Lua (5 + 2 = 7. Na antiguidade os planetas eram reverenciados e cercados de misticismo e folclore. Na Escandinávia o domingo era chamado de o dia do Sol (Sunnudagr), a segunda-feira era o dia da Lua (Mánadagr), a terça-feira era o dia de Tyr (Týsdagr), a quarta-feira era dia de Odin (Óðinsdagr), a quinta-feira era dia de Thor (Þórsdagr), a sexta-feira era dia de Freyja ou Frigg (Frjádagr) e sábado era o dia do banho (Laugardagr).

 Os germânicos substituíram os deuses greco-romanos da semana: o deus Hélios ou Sol (domingo), senhor do astro Solar, pela deusa Sunna ou Sól; Selene ou Luna (segunda-feira), a deusa da Lua, por Máni, o deus da Lua; Ares ou Marte (terça-feira), o deus da guerra e do furor guerreiro, por Ziu/Tiw/Týr; Hermes ou Mercúrio (quarta-feira), deus das artes, magia, intelecto, sabedoria, por Wodan/Woden/Óðinn; Zeus ou Júpiter (quinta-feira), senhor do clima, das tempestades e do raio, por Þonar/Þunor/Þorr; Afrodite ou Vênus (sexta-feira), deusa do amor, beleza e fertilidade, por Freyja (ou Frigg); e Saturno (sábado) ficou sem um correspondente claro, mas foi associado a água ("dia do banho"). Os deuses Njord (Njörðr) e Freyr são identificados com Saturno em manuscritos antigos, pois eles eram deuses da abundância, colheita e ligado ao plantio. Há outras semelhanças: Njord era o chefe do Vanir e foi enviado aos Æsir e Saturno foi expulso do cargo de rei dos deuses e enviado ao Campo dos Afortunados ou no Lácio (dependendo da fonte). Saturno tinha uma foice e Freyr uma espada. Njord era associado as águas, pois vivia perto do mar, sua contraparte germânica, Nerthus, também tinha conexão com a água. É muito possível que o sábado era ligado ao Vanir, que conhecem o futuro, que é o dia que representa a sorte. Assim, temos três Æsir nos dias da semana: Tyr, Odin e Thor; dois Vanir: Freyja e Njord (ou Freyr); e dois seres divinos: Sunna e Máni. A raça de Sunna e Máni são é clara, eles são chamados de filhos de Mundilfari que é referido como um homem (maðr), mas pode ser apenas pra indicar o sexo biológico dele (o mesmo acontece com deuses e gigantes). Contudo, vale lembrar que o Sol e Lua foram criados das fagulhas de Muspellsheim (Múspellsheimr) pelo trio criador, os filhos de Bor (Borr), e que os irmãos Sunna e Máni foram colocados no céu para conduzir esses astros, ou seja, os astros já estavam criados e seus condutores foram colocados depois. É possível que eles sejam elfos, porque a Sól é chamada de "Glória dos Elfos" (Álfröðull). A sexta-feira é relacionado a Freyja na Escandinávia e a Frigg no território inglês.

 O folclore da Islândia coletado em 1866 contava que:

"É dito que quem nasceu domingo, nasceu para vencer! 

 "Numa segunda-feira, para incomodar;

Numa terça-feira, para prosperar;

Numa quarta-feira, para moldar;

Numa quinta-feira, para a glória;

Numa sexta-feira, para a riqueza;

Num sábado, para a sorte." 

Tradução minha. 

 Com base no folclore, é possível que isso venha de longa data, práticas antigas, mesmo quando uma religião é extinta, permanece no imaginário popular. O Sol representa a vitória porque a luz ilumina a escuridão e afasta as trevas que é os obstáculos (a deusa Sól tem esse papel, pois ela transforma Trolls em pedra com sua luz). A Lua muda de fases e simboliza a incerteza, confusão, inconstância e por isso incomoda e causa problemas (o deus Máni é associado aos eclipses, fim de ciclo, mudanças e antigamente a loucura era associado ao corpo celeste). A terça-feira representa a coragem e persistência para superar desafios e assim prosperar por sua determinação (Tyr representa exatamente isso na antiga fé). A quarta-feira simboliza o intelecto para realizar, modelar e moldar os objetivos (Odin é o moldador de destinos, reis, heróis, ele é o senhor das artes). A quinta-feira representa a força para superar obstáculos e com isso ter a glória desejada (Thor é o maior guerreiro de Asgard (Ásgarðr), é o maior dos heróis, e o mais famoso dos deuses e heróis). A sexta-feira simboliza a prosperidade, abundância e riqueza (Freyja é a deusa que possui tesouros e é filha do deus da abundância e riqueza: Njord). O sábado representa o destino e a sorte, mas é como um presente: pode ser benigno como maligno. 


FONTES:

As Casas dos Deuses no Grímnismál e o Zodíaco, Marcio A. Moreira

Dictionary of Northern Mythology, Rudolf Simek trad. Angela Hall

Icelandic Legends, collected by Jón Arnason trad. de George E. J. Powell & Eiríkr Magnússon

Invocando os Deuses Nórdicos dos Tempos Primitivos aos Tempos Modernos, Marcio A. Moreira

Scandinavian Mythology, Hilda R.E. Davidson

Thor era representado como personificação do céu?

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